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Elaine Bahia Wutke
Engenheira agrônoma e pesquisadora do Instituto Agronômico ““ IAC – Centro de Grãos e Fibras ““ Leguminosas
Luis Felipe Villani Purquerio
Engenheiro agrônomo e pesquisador do Instituto Agronômico ““ IAC, Centro de Horticultura ““ Hortaliças
Sebastião Wilson Tivelli
Engenheiro agrônomo e pesquisador do Departamento de Descentralização do Desenvolvimento ““ DDD, Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento em Agricultura Ecológica
A adubação verde é uma prática agrícola utilizada há mais de 2.000 anos pelos chineses, gregos e romanos, com o objetivo principal de aumento da produção das lavouras. O “adubo verde“ nada mais é do que “a planta cultivada“, de preferência uma leguminosa (fabácea), devido à capacidade de fixação do nitrogênio, com a finalidade de elevar a fertilidade do solo e produtividade das culturas.
Compreende o cultivo e o corte de plantas, sobretudo imaturas, na plena floração e início de formação de vagens. A fitomassa verde ou seca (mulch) pode ser produzida no local ou mesmo trazida de fora, utilizada durante todo o ano ou apenas em parte dele, e pode ser incorporada ao solo ou não.
Adoção
A adoção da adubação verde é mais frequente em culturas frutÃferas do que em hortaliças porque, como o olericultor pode irrigar as hortaliças durante a maior parte do ano agrícola, prefere obter um rápido retorno econômico com o cultivo sucessivo de distintas espécies de hortaliças.
Entretanto, apenas com a rotação entre hortaliças de diferentes famílias, nem sempre são resolvidos problemas como compactação do solo e incidência de nematoides, pragas ou doenças, por desequilíbrio biológico, e que poderiam ser minimizados ou até mesmo solucionados pelo cultivo dos adubos verdes.
No caso do consórcio de adubos verdes com hortaliças, além de muito escassos, os estudos não são conclusivos e, às vezes, seus efeitos são negativos em parâmetros de produtividade dessas culturas, particularmente devido à competição espacial, lateral e em altura, e consequente situação de sombreamento, além de eventual concorrência por água e nutrientes em espaço limitado.
Quando usar
Os produtores poderão utilizar os adubos verdes em cultivos exclusivos (“solteiros“) ou mesmo em misturas ou “coquetéis“ nas seguintes situações:
– Em esquemas de rotação ou sucessão, sobretudo com as culturas de hortaliças (aipo, alcachofra, alface, almeirão, beterraba, cebola, cenoura, couve-flor, feijão-vagem, pepino, pimentão, rúcula, tomate);
– Em esquemas de consórcio ou de cultivo intercalar.
Em ambos os casos, mas, sobretudo, nos cultivos exclusivos dos adubos verdes e, dependendo do sistema de produção na propriedade, o agricultor poderá optar tanto pela produção de fitomassa quanto de grãos dos adubos verdes (crotalárias, mucunas, guandu, labelabe, feijão de porco), para geração de uma eventual renda extra e contribuindo para redução de alguns dos custos de produção.
De modo geral, a adubação verde atua promovendo efeitos diversos, positivos e variáveis em características químicas, físicas e biológicas do solo, devido à cobertura vegetal viva ou morta, incorporada ou não ao solo e que dependem das condições locais e da frequência de uso. Esses efeitos, que podem ser obtidos em médio e longo prazos, são também vantajosos às hortaliças e estão resumidamente relacionados a seguir.
Características químicas
A adubação verde faz a incorporação do nitrogênio atmosférico pelas leguminosas devido à fixação com bactérias do gênero Rhizobium e Bradhyrhizobium, por meio de simbiose nos nódulos radiculares (aproveitamento médio da ordem de 40% pela cultura em sucessão).
Cabe ressaltar que é possível reduzir ou até mesmo não aplicar adubo nitrogenado mineral nas culturas em sucessão ou intercalares, sendo o solo “enriquecido“ com esse macronutriente. Na simbiose leguminosa/rizóbio, por exemplo, em média podem ser fixados 100 kg de nitrogênio por hectare de solo cultivado, sendo a energia despendida para produção de 50 kg de fertilizante nitrogenado equivalente à quela proporcionada por cerca de 80 litros de gasolina, quantidade inferior à fixada biologicamente por essa leguminosa.
Há, ainda, a manutenção ou aumento da matéria orgânica, que funciona como uma espécie de cimento, aglutinando as partículas de solo e colaborando para a formação dos agregados, contribuindo para melhorar a estrutura e a porosidade do solo.
Em consequência, o produtor pode obter melhoria e ou aumento da infiltração e da capacidade de armazenamento da água da chuva e da irrigação, com consequente redução da quantidade da água escoada na enxurrada, pois os agregados são mais estáveis e o processo erosivo dos solos é diminuÃdo.
Ciclagem de nutrientes pouco solúveis e lixiviados em profundidade, sobretudo e, particularmente, devido ao crescimento vigoroso e em profundidade do sistema radicular das leguminosas. Com isso se têm maior disponibilidade de macro e micronutrientes em formas assimiláveis pelas plantas.
Aproveitamento dos nutrientes residuais dos adubos verdes pelas culturas subsequentes e/ou adjacentes (em consórcio ou em aleias), em quantidades variáveis, conforme a espécie de adubo verde utilizada, o tempo de decomposição, a temperatura do ambiente, o grau de umidade do solo, manejo e fertilidade do solo, dentre outros.
Liberação de ácidos orgânicos pelas raízes, importantes na solubilização dos minerais do solo, que são disponibilizados às culturas, como por exemplo, os ácidos piscÃdicos, responsáveis pela solubilização e disponibilização do fósforo combinado ao ferro (Fe) em guandu.
Complexação do alumÃnio trocável para uma forma não disponível no solo.
Em características físicas
Proteção ao impacto direto de gotas de chuva de grande energia cinética na superfície do solo, devido à cobertura vegetal estabelecida, evitando-se sua desagregação e contribuindo, consequentemente, para sua conservação.
Aumento da porosidade do solo, com melhoria de sua estrutura e redução do selamento superficial; aumento da retenção de água e melhoria da capacidade de infiltração e de armazenamento com consequente diminuição da enxurrada e da erosão; diminuição da variação da temperatura dia-noite e de seus efeitos na superfície do solo e em profundidade, sendo favorecido o aprofundamento de raízes e o aumento da microfauna e microflora.
Há possibilidade de descompactação do solo pelo cultivo de algumas espécies com desenvolvimento radicular adequado para esse objetivo, favorecendo o enraizamento das plantas em profundidade.