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A agricultura irrigada em cenários de escassez hídrica

 

Edmar José Scaloppi

Doutor em Engenharia de Irrigação e professor da UNESP

edmar@fca.unesp.br

 

A agricultura irrigada em cenários de escassez hídrica - Crédito Ademir Torchetti
A agricultura irrigada em cenários de escassez hídrica – Crédito Ademir Torchetti

A água para irrigação representa a maior proporção entre tantos outros usos competitivos. Apenas para ilustrar, uma população de 100.000 habitantes utiliza, aproximadamente, a mesma quantidade de água que apenas 400 hectares de área irrigada, assumindo-se que os sistemas de irrigação apresentem um desempenho muito satisfatório.

Este dado baseia-se em uma demanda hídrica pelas culturas irrigadas de quatro milímetros por dia e uma eficiência de irrigação de 80%, perfazendo um volume diário requerido de 50.000 litros por hectare.

Aproximadamente 70% da água doce do planeta são utilizados na agricultura. Na China e Índia, essa proporção se aproxima de 90%. Em 2002, mais de 30 países já revelavam restrições na disponibilidade de água para múltiplas finalidades (Fischer et al., 2002).

Em 2050, este número poderá atingir 55 países, a maioria em processo de desenvolvimento. Para estes autores, a escassez hídrica, juntamente com a degradação dos solos, deverão se constituir nos principais obstáculos à produção de alimentos, fibras e energia renovável. Essa previsão, associada à elevada proporção de uso na agricultura irrigada, deveriam motivar investigações oportunas para enfrentar essa incômoda realidade.

Alternativas

Ao contrário da pluralidade de alternativas para a produção de energia, o problema da água se agrava na medida em que não apresenta solução alternativa. Assim, a racionalização representa a grande oportunidade para a preservação quantitativa e qualitativa deste recurso natural indispensável e insubstituível.

Há quem arrisque uma previsão para um futuro não muito distante, da existência de grandes comboios marítimos transportando água potável entre nações produtoras e populações consumidoras.

A tese da transposição de bacias hidrográficas, que já foi pauta de acaloradas discussões técnicas e políticas, está atualmente sendo implementada no país e, de alguma forma, parece antecipar e reforçar esta inusitada previsão.

Alerta

O fato de, em geral, não haver monitoramento para fins de cobrança ou taxação, deixa o agricultor-irrigante como único responsável pela gestão e controle do uso da água para irrigação.

Por outro lado, seria insensato exigir de cada agricultor o conhecimento técnico e o instrumental necessário para racionalizar a aplicação de água às culturas irrigadas, uma vez que o próprio dimensionamento dos sistemas de irrigação pode não estar comprometido com a economia de água, pelo fato do superdimensionamento representar um maior valor comercial para as empresas fornecedoras de equipamentos.

Mesmo assim, os benefícios econômicos acabam prevalecendo, contribuindo para justificar até mesmo custos desnecessários.

O problema da água se agrava na medida em que não apresenta solução alternativa Crédito Shutterstock
O problema da água se agrava na medida em que não apresenta solução alternativa Crédito Shutterstock

Orientação

A experiência demonstrada pela grande prática da irrigação tem revelado que, em geral, na ausência de orientação e monitoramento apropriados, há uma tendência de se promover uma aplicação excessiva de água às culturas irrigadas, à semelhança do que ocorre com frequência em hortas domésticas e áreas ornamentais.

O grande problema, além do desperdício, é a possibilidade da água apresentar substâncias solúveis, notadamente sais, que são propositalmente injetados ou naturalmente dissolvidos, sendo arrastados pela corrente líquida até os mananciais, agravando a qualidade do recurso hídrico original.

Por outro lado, deve-se reconhecer que o desenvolvimento científico e tecnológico tem proporcionado uma diversidade de recursos capazes de racionalizar a aplicação de água às culturas. O grande impasse reside na forma de repassar esses recursos ao agricultor-irrigante.

Os países mais desenvolvidos há muitos anos criaram uma rede de laboratórios-móveis que se deslocam às áreas irrigadas expressivas, com o objetivo de avaliar os sistemas de irrigação para posterior recomendação das providências necessárias à obtenção de melhores níveis de desempenho.

Este procedimento baseia-se nas particularidades de cada condição onde a irrigação é praticada, merecendo, portanto, soluções específicas, que passam a ser acompanhadas pelos técnicos responsáveis pelo laboratório envolvido.

Outro importante fator a ser considerado é que ainda prevalecem dimensionamentos baseados em dotações irrestritas de recursos hídricos, ao invés de procurar induzir restrições hídricas intencionais e seletivas para racionalizar a aplicação de água sem comprometer significativamente a produção agrícola.

Ao que parece, a incorporação de conceitos atuais como “irrigação deficiente“, “efeitos compensatórios de déficits hídricos moderados nas culturas“ e “inclusão da eficiência de uso de água na avaliação da irrigação“, decisivos para assegurar a sustentabilidade da agricultura irrigada, não consegue sensibilizar muitos técnicos, que ainda praticam conceitos desgastados de dotação hídrica irrestrita.

 

Essa matéria completa você encontra na edição de março da revista Campo & Negócios Grãos. Adquira a sua para leitura completa.

 

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