Autor
Sueellen Pereira da Silva
Engenheira agrônoma e doutoranda em Horticultura – UNESP – Botucatu
sueelle_su@hotmail.com
Vander Rocha Lacerda
Engenheiro agrônomo e mestrando em Horticultura – UNESP – Botucatu
A mandioquinha-salsa (Arracacia xanthorrhiza Bancroft), também conhecida por mandioquinha, batata-baroa ou batata-salsa, é um alimento com paladar muito peculiar, cada vez mais comum na mesa do brasileiro e mais valorizado pela alta gastronomia.
A cultura constitui-se em ótima alternativa para pequenos e médios produtores, especialmente dentro dos conceitos de agricultura familiar, em função da considerável demanda por mão de obra, principalmente nas fases de preparo de mudas, plantio e colheita, operações que exigem critério, capricho e cuidados no manuseio. Além disso, tem por características a baixa utilização de insumos e o reduzido custo de produção.
Maiores regiões produtoras
No Brasil, o plantio da mandioquinha-salsa disseminou-se nas regiões de Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina, Espírito Santo e São Paulo, que concentram a maior parte da produção. A mandioquinha-salsa é cultivada em mais de 20.000 hectares, com uma produção média de 250 mil t/ano. A maior parte da produção segue para o mercado in natura.
Exigências de cultivo
A mandioquinha-salsa se adapta melhor às regiões com clima semelhante ao de sua origem, como temperatura média anual entre 15 e 18°C e regiões com altitude superior a 800 m. No entanto, verifica-se seu cultivo em áreas mais baixas, como na Zona da Mata mineira e em baixadas litorâneas de Santa Catarina, expandindo para o Distrito Federal e Goiás, onde a temperatura média anual supera os 20°C.
A cultura se adapta melhor a solos de textura mediana, no entanto, apresenta grande adaptabilidade a diversos tipos, desde que se faça um bom manejo da água. Solos muito pesados ou mal preparados causam a produção de raízes curtas e arredondadas, assemelhando-se a batatas.
A mandioquinha-salsa também não tolera solos encharcados, consequentemente, exige que sejam bem drenados. Quando se realiza o plantio em épocas chuvosas ou em solos mal drenados, geralmente utilizam-se leiras mais altas para minimizar o acúmulo de água junto às plantas.
É importante ressaltar que solos com elevados teores de matéria orgânica apresentam restrições, pois contribuem com grande desenvolvimento vegetativo e, consequentemente, perda do acúmulo de reservas e menor produção de raízes. Além disso, esses solos normalmente apresentam coloração escura, o que interfere no aspecto visual das raízes, pela ocorrência de manchas superficiais.
Exigências hídricas
Outro fator de suma importância é em relação às exigências hídricas da cultura. A mandioquinha-salsa é considerada relativamente tolerante à seca. Deste modo, muitos produtores não utilizam a prática da irrigação.
No entanto, em casos de adversidades climáticas, a produtividade é comprometida e o risco de insucesso é elevado. Ainda que apresente tolerância moderada, a cultura responde favoravelmente a condições de boa disponibilidade de água no solo, o que torna a irrigação uma prática fundamental para produtores que têm como objetivo a obtenção de altos níveis de produtividade, podendo ter um aumento de duas a três vezes em relação a áreas não irrigadas.
Assim, deve-se atentar ao volume requerido pela cultura, pois o excesso de água pode reduzir a aeração do solo e favorecer a maior incidência de doenças e lixiviação de nutrientes.
A necessidade hídrica da cultura depende das condições climáticas e da duração do ciclo de desenvolvimento, variando entre 600 e 1.000 mm. A prática de irrigação pode ser realizada por diferentes sistemas, sendo a aspersão o mais empregado.
Do plantio à colheita
A produção de mudas é a fase mais importante, pois cuidados devem ser tomados para melhorar a qualidade do processo e do produto final, como a escolha criteriosa de plantas matrizes, com boa sanidade e vigor, podendo utilizar mudas ainda vigorosas e em pleno desenvolvimento, o que garante uniformidade das plantas no campo. Deve-se atentar também para a escolha dos filhotes, adotando critérios como idades fisiológicas semelhantes, o que é avaliado pelo tamanho da reserva dos propágulos.
Eventualmente são necessárias manutenções nas mudas entre a colheita e o plantio subsequente, mantendo-se as touceiras à sombra, após retiradas as raízes e as folhas, quando presentes, mantendo a base da planta em contato com o solo sem destacar os perfilhos. A irrigação deve ser realizada, em média, duas vezes por semana.
Para o preparo inicial das mudas é realizado o destaque dos perfilhos e lavagem por imersão ou em água corrente para retirada do excesso sujidades. Posteriormente, recomenda-se realizar o tratamento fitossanitário dos filhotes em solução de água sanitária comercial, pela ação do cloro ativo, na proporção de um litro de água sanitária para nove litros de água, seguido de secagem à sombra, considerando-se o teor médio de 2,2% de hipoclorito de sódio na água sanitária, por um período de cinco a 10 minutos, sendo esse processo indispensável. Após a secagem dos filhotes tratados, efetua-se o preparo das mudas.
Deve-se efetuar corte em bisel, utilizando ferramenta afiada e lâmina chata, que corte o filhote sem rachá-lo. O corte bem efetuado, sem que o filhote lasque, proporciona raízes reduzidas, facilitando o destaque na colheita e aumentando sua conservação pós-colheita. De acordo com a variedade, a época do ano e o método de plantio utilizado (no local definitivo ou em canteiros de pré-enraizamento), deve-se deixar de 1,0 a 3,0 cm de reserva.
Espaçamento
Para o plantio da mandioquinha-salsa, o espaçamento recomendado entre os camalhões é determinado no enleiramento, devendo ser de 70 a 80 cm. Entre plantas nas leiras, o espaçamento ideal varia de acordo com o local e época de plantio. Além da variedade a ser plantada, normalmente se utilizam espaçamentos de 30 a 40 cm. É importante que se evite condição de fechamento excessivo da lavoura em épocas chuvosas. Desse modo, nesses períodos o espaçamento deve ser maior.
Outo fator muito importante é a profundidade de plantio. A região do coleto deve ser mantida na interface solo – ar. É importante destacar que o plantio muito profundo tende a favorecer o crescimento excessivo da cepa, direcionando o acúmulo de reservas para esta região, vulgarmente chamada de pescoço, e consequentemente, causando prejuízos às raízes.
O plantio diretamente no local definitivo, sem nenhum tratamento de pré-brotação ou pré-enraizamento, ainda é o método mais empregado para a produção da cultura. O plantio é realizado no centro e no topo das leiras, em profundidade de 3,0 cm a 5,0 cm.
Obstáculos
Pelo sistema convencional de cultivo tem-se limitação quanto à época de plantio. No Sudeste, os plantios ocorrem principalmente de março a junho. No entanto, é possível o plantio durante o ano todo em regiões de clima ameno. Porém, cuidados devem ser tomados para que se obtenham bons resultados.
Plantios realizados no verão proporcionam alto índice de apodrecimento de mudas, devido aos fatores climáticos como elevadas temperatura e precipitação, tendo em vista a maior exposição do córtex das mudas pela ação do corte realizado no ato do plantio, o que favorece o surgimento de bactérias e fungos de solo.
Esse fato implica na redução do pegamento e, consequentemente, afeta a produtividade. Em contrapartida, ocorre redução do ciclo vegetativo da cultura, havendo maior precocidade na produção, permitindo ao agricultor a probabilidade de preços mais elevados na comercialização do produto colhido.
Já em épocas muito frias, com ocorrência de fortes e numerosas geadas, o plantio pode apresentar desuniformidade e redução de produtividade. Apesar de se tratar de uma cultura extremamente resistente ao frio, no estágio inicial as plantas não possuem grande quantidade de reservas, o que pode contribuir para o esgotamento de reservas nessa fase, se houver ocorrência de muitas geadas consecutivas.
Essas causas ocorridas em épocas limitantes, tanto pelas elevadas temperaturas e precipitações quanto pelo frio excessivo, podem ser viabilizadas com o emprego da técnica de pré-enraizamento, associado à seleção de mudas e ao cultivo protegido. É fundamental promover o enraizamento das mudas em canteiros devidamente preparados por cerca de 45 a 60 dias. Posteriormente é realizado o transplantio para o local definitivo. É importante utilizar mudas com menor quantidade de reservas, entre 1,0 e 2,0 cm.
Adubação e tratos culturais
É importante destacar que a recomendação de adubação varia conforme a situação e deve ser realizada de acordo com a análise de solo. Pode ser realizada a adubação orgânica em solos arenosos, com a aplicação de 03 a 06 t.ha-1 de composto orgânico ou esterco de curral curtido, visando o aumento da capacidade de retenção de água e nutrientes. No entanto, é importante que se tenha cuidado com o excesso de matéria orgânica a ser aplicada, para que não haja excessivo crescimento da parte aérea.
O nitrogênio é um nutriente que também contribui com o crescimento da parte aérea. Esse elemento, em excesso, pode favorecer o maior crescimento das plantas e, consequentemente, contribuir com o surgimento de pragas e doenças. Além disso, pode favorecer o aumento foliar, o que contribui com o maior fechamento da lavoura.
No caso de ocorrência de sintomas de deficiência de nitrogênio, caracterizados pelo amarelecimento foliar, começando pelas folhas mais velhas, e redução de crescimento, pode-se efetuar uma ou duas adubações de cobertura aos 45 dias, ou parcelado aos 30 e 60 dias.
A adubação fosfatada deve ser realizada no plantio. O adubo deve ser aplicado na região onde as raízes vão se desenvolver. Sua carência provoca acentuada redução do crescimento e coloração verde-escura a azulada nas folhas.
No caso de surgimento de sintomas em lavouras em fase de desenvolvimento, pode-se fazer aplicações foliares complementares. O potássio está ligado diretamente à qualidade do produto comercial, conferindo melhor resistência pós-colheita. Deve ser aplicado no plantio, podendo-se fazer adubações, se houver necessidade, devido à sua razoável mobilidade no solo.
Colheita
A colheita de propágulos deve ser feita, no mínimo, a partir de 180 dias após o transplantio, podendo se estender por até 10 meses. É de suma importância o planejamento da época de estabelecimento do campo de produção de mudas em função dos plantios programados na próxima safra.
A colheita pode ser realizada de forma manual, com o auxílio de enxadões, ou semimecanizada. A prática manual consiste no arranquio das plantas e destaque das raízes. Para o arranquio pode-se fazer uso de enxadões, no caso de plantas mais presas ao solo, conforme o tipo de solo e o teor de umidade desse.
Em épocas secas, uma irrigação leve no dia anterior à colheita facilita essa operação. Na colheita semimecanizada efetua-se a soltura das plantas por meio de arados de aiveca ou lâminas subsuperficiais que passam sob as plantas, levantando-as, eliminando a fase de arranquio das plantas e facilitando a colheita.
Investimento
O investimento para implantação dessa cultura em espaçamento de 90 x 30 cm é, em média, de R$ 25.000,00 por hectare, podendo variar entre as diferentes regiões do Brasil.
Tendo-se custo de produção total por hectare de R$ 25.000,00 e produção estimada em 25 t/ha ou 1.250 caixas/ha, chega-se a um custo de R$ 20,00 por caixa. Entretanto, considerando a média nacional de 9,3 t/ha ou 465 caixas/ha, e o fato de que a maioria dos produtores não têm acesso à assistência técnica especializada, tem-se um menor custo total/ha, porém, um maior custo por caixa devido à produtividade ser menor.
Na CEASA-MG a mandioquinha é classificada, na comercialização, em extra A e especial, com preço médio atual (março/2019) de R$ 3,0/kg, equivalente a R$ 60,00 a caixa/20 kg. A produtividade de 1.250 caixas/ha resulta em receita bruta de R$ 75.000,00/ha.
Subtraindo-se o custo de produção da receita bruta, chega-se à receita líquida ou margem de R$ 50.000,00/ha.
O tempo do plantio até a colheita é de cinco a 10 meses, o que pode variar devido à cultivar utilizada no plantio, com ou sem pré-enraizamento, ao clima e manejo. A utilização de cultivares mais precoces e pré-enraizadas antecipam o retorno e lucro do investimento inicial.
As peculiaridades da cultura, perecibilidade e rigidez de oferta resultam em um produto de elevado preço de mercado. Desta forma, as novas tecnologias e cultivares precoces e produtivas proporcionam uma relação custo/benefício ainda melhores.
A cada R$ 100,00 investidos nessa cultura trabalhosa, mas altamente rentável, retorna-se R$ 300,00. Se aplicado de forma correta, é um investimento economicamente viável, uma vez que o retorno em benefícios econômicos é compensatório.