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O porta-enxerto é fundamental para o sucesso da atividade vitivinÃcola. Por isso, o produtor deve seguir orientação e investir em materiais recomendados para sua condição de plantio
O uso de porta-enxertos é uma prática utilizada na maioria das regiões vitÃcolas do mundo, principalmente como meio de defesa contra a filoxera, uma praga limitante ao desenvolvimento de cultivares de Vitis vinifera. Os porta-enxertos também são usados na viticultura com diversos outros objetivos, como adaptação a determinadas condições climáticas (regiões temperadas ou tropicais), adaptação a diferentes tipos de solo (calcários, ácidos, salinos), controle de pragas e doenças de solo (nematoides, fusariose, entre outros).
Normalmente, os porta-enxertos alteram características de vigor, precocidade de produção e produtividade às copas.
Recomendações gerais
Além da adaptação às condições ambientais específicas de onde se quer implantar o vinhedo, é fundamental, na escolha do porta-enxerto, considerar o objetivo da exploração. Neste particular, o vigor do porta-enxerto é fator preponderante.
Como regra geral, recomenda Daniel Santos Grohs, engenheiro agrônomo e mestre em Fitotecnia, analista da Embrapa Uva e Vinho, para a produção de uvas de mesa e de uvas para suco, casos em que interessa uma alta produtividade, é recomendável a utilização de porta-enxertos vigorosos.
“Quando o objetivo são uvas de alta qualidade para a produção de vinhos ou produção antecipada de uvas de mesa, devem ser preferidos os porta-enxertos de baixo vigor. Estes condicionam um desenvolvimento vegetativo limitado da copa, com reflexos positivos sobre a maturação e qualidade da uva“, pontua.
Evidentemente, a escolha do porta-enxerto é também função das condições de solo. Assim, em solos de alta fertilidade, mesmo quando o objetivo é a obtenção de alta produtividade, é conveniente optar por porta-enxertos de médio vigor, descartando os vigorosos para evitar um desenvolvimento vegetativo excessivo com consequências negativas sobre o estado sanitário das plantas (maior incidência de doenças fúngicas) e sobre a produtividade (desavinho).
Da mesma forma, em solos muito pobres não é recomendável o uso de porta-enxertos fracos pois, nestas condições, as plantas poderão não atingir o vigor necessário para a obtenção de produções econômicas.
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Recomendações por região
Na região Sul do Brasil, de clima subtropical (especialmente entre o Sul do Paraná até a metade norte do Rio Grande do Sul), conta o analista Daniel Grohs, o porta-enxerto é recomendado a partir do histórico de pragas na área do futuro parreiral. “Quando há o histórico de morte de plantas, especialmente por ocorrência da doença fusariose (muito comum, especialmente na região da Serra Gaúcha) o porta-enxerto mais recomendado é o Paulsen 1103, que tem tolerância a esta doença. Especialmente áreas de renovação de vinhedos não poderão fugir desse porta-enxerto“, enfatiza.
Outra limitação fitossanitária nesta região Sul do Brasil, que define a escolha do porta-enxerto é a presença de pérola-da-terra (inseto sugador que incide nas raízes da planta). Neste caso, o porta-enxerto mais indicado é o VCR 043-43, que apresenta resistência ao inseto. Porém, deve-se destacar que este porta-enxerto é sensÃvel a doenças de solo, como a fusariose.
Já para regiões com a produção do tipo tropical, diminui-se a presença de fungos de solo e a escolha do porta-enxerto é baseado no sistema de cultivo e objetivo da produção. Em geral, dá-se grande ênfase aos porta-enxertos desenvolvidos pelo Instituto Agronômico de Campinas, com ênfase para as cultivares IAC 572 e IAC 766.
“A grosso modo, a partir do norte do Paraná, A recomendação é para o IAC 572 ou 766. Do sul do Paraná até o Rio Grande do Sul já é indicado o Paulsen 1103, com exceções para áreas com pérola-da-terra, nas quais o porta-enxerto 04343 é mais adaptado“, ensina o agrônomo da Embrapa.
Finalmente, nas regiões especializadas na produção de uvas finas para vinhos (como a Campanha Gaúcha, região de Altitude de Santa Catarina, etc.) é desejado o uso de porta-enxertos redutores de vigor e que conferem precocidade de produção, com destaque para 101-14, 161-49, 420A, SO4.
Porém, deve-se ressaltar que estes materiais são muito sensÃveis a doenças de solo e pérola-da-terra, o que torna a seleção da área extremamente importante. Ou seja, antes do e produtor selecionar o porta-enxerto em função do seu tipo de produção, é necessário conhecer o histórico da sua área.
Cultivares em destaque
A seguir, Daniel Grohs enumera os principais porta-enxertos utilizados na viticultura brasileira:
Paulsen 1103: largamente utilizado no Sul do Brasil, especialmente por sua tolerância à fusariose e facilidade de enxertia (“pegamento“) e enraizamento. A copa confere médio a alto vigor, retardando a maturação, por isso seu uso deve ser considerado de acordo com a fertilidade da área. Empregado especialmente para cultivares americanas e híbridas em solos de baixa a média fertilidade e com cultivares vinÃferas em solos de média fertilidade. Apesar de sua tolerância em áreas de fusariose, não tem apresentado bom desempenho a outras doenças de solo, cada vez mais comuns no Sul do Brasil, como o pé-preto.
VCR 043-43: porta-enxerto desenvolvido para resistência a filoxera e que, no Brasil, mostrou-se com boa resposta em áreas infestadas por pérola-da-terra. A maior limitação da cultivar é sua baixa afinidade com a copa (difícil enxertia), bem como seu baixo percentual de enraizamento. Além disso, são extremamente vigorosos, induzindo atrasos e dificuldades na maturação da uva.
Não apresenta bom comportamento em áreas com histórico de doenças de solo, como pé-preto.
IAC 572: porta-enxerto largamente utilizado para variedades de uva de mesa (regiões do Nordeste, São Paulo e norte do Paraná). Induz elevado vigor à copa. Utilizado principalmente nas regiões quentes, assim como o IAC 766. Apresenta ampla adaptação a solos (argilosos, arenosos e ácidos) e excelente pegamento e enraizamento. Não é recomendado para regiões frias, pois seus ramos dificilmente perdem suas folhas no inverno.
101-14: é um porta-enxerto pouco vigoroso e precoce, com sistema radicular superficial. É indicado especialmente para uvas destinadas à elaboração de vinhos finos em solos de média a alta fertilidade. Neste caso, apresenta indução plena da maturação da uva, bem como sua antecipação. Deve ser utilizado em áreas livres de fusariose, sem histórico de seca ou que não tenha elevada acidez.
420A: é um porta-enxerto pouco vigoroso, induzindo médio vigor à copa, adiantando a maturação da uva e conferindo média produtividade à copa. Por isso, é uma opção para uso em cultivares vinÃferas finas para vinho. Deve ser utilizada em áreas livres de fusariose e em solos de média fertilidade. Destaca-se sua sensibilidade ao alumÃnio e a solos com carência de potássio.
161-49: denominado, na região da Serra Gaúcha, como “branco rasteiro“. Foi largamente utilizado no passado, porém, em função da sua alta suscetibilidade à Fusariose, foi sistematicamente substituÃdo pelo P1103. Assim como o 420 A, o 161-49 também é um porta-enxerto de pouco vigor, que pode ser usado para a produção de uvas para a elaboração de vinhos finos, conferindo produtividades sem excessos.
SO4: Em geral, confere médio vigor, sendo recomendável para produção de uvas finas para vinho. Tem sido largamente utilizado na região vitivinÃcola da Campanha Gaúcha, devido à sua maior tolerância a solos secos e com maiores teores de alumÃnio. Em outras regiões, tem seu uso limitado devido à alta sensibilidade à fusariose e a problemas de dessecamento do engaço, uma anomalia verificada em certos anos, devido ao desequilíbrio nutricional envolvendo o balanço entre potássio, cálcio e magnésio.
Cabe destacar que, ao adquirir porta-enxertos para plantio, o produtor deverá conhecer as principais características ampelográficas que permitam sua identificação.