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Carlos Eduardo Faroni
Engenheiro agrônomo, doutor em Solos e Nutrição de Plantas (ESALQ/USP)
O uso agrícola de produtos à base de substâncias húmicas como fertilizantes orgânicos, condicionadores orgânicos de solo e estimuladores dos processos fisiológicos tem crescido bastante nas últimas décadas em todo o mundo, e mais recentemente no Brasil.
A aplicação foliar desses produtos tem se tornado uma prática bastante difundida entre produtores de hortaliças e plantas frutÃferas, além dos cultivos de cereais, algodão e outras culturas que ocupam maiores extensões de área, como a cana-de-açúcar e o eucalipto.
Dessa forma, o uso de ácidos húmicos tem se concentrado nas principais regiões hortÃcolas e produtoras de frutas e nos produtos de maior valor agregado (cinturões verdes próximos às grandes capitais, Vale do Ribeira e Vale do São Francisco). Com a difusão do conhecimento sobre os benefícios do uso de ácidos húmicos, regiões tipicamente produtoras de grãos, como a Centro-Oeste, tem intensificado o uso desses produtos, seja na forma de condicionadores orgânicos de solo ou na forma de fertilizantes organominerais.
Atualmente, a cultura que mais tem consumido grandes quantidades de substâncias húmicas para sua produção é a cana-de-açúcar. Com a expansão das empresas produtoras de bioenergia à base de cana-de-açúcar, tanto em área como em produtividade, os ácidos húmicos têm sido intensamente utilizados para estimular a brotação inicial, diminuir falhas de estande e aumentar o vigor das plantas, principalmente para o ciclo de cana planta.
Mais recentemente, os ácidos húmicos têm sido utilizados no ciclo de soqueiras para estimular a brotação após o corte, aumentar o aproveitamento dos nutrientes do solo e dos fertilizantes minerais e, por consequência, aumentar a produtividade da cultura.
O estado de São Paulo é o maior consumidor de ácidos húmicos para a cultura da cana-de-açúcar, mas o seu uso tem se espalhado rapidamente para os estados de Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais.
Pesquisas
A maioria dos trabalhos cientÃficos apontam para uma estimulação da atividade e a promoção da síntese das enzimas H+-ATPases da membrana plasmática, num efeito tipicamente auxÃnico. Pesquisas científicas realizadas com plantas de milho tratadas com substâncias húmicas de turfa também mostraram a estimulação da atividade da H+-ATPase associada a um aumento na absorção de nitrogênio e, consequentemente, a um melhor desenvolvimento das plantas.
Outros estudos demonstram que os ácidos húmicos influenciam na absorção de nutrientes e, consequentemente, no metabolismo vegetal. Os efeitos dos ácidos húmicos sobre o metabolismo das plantas têm como principais resultados:
– influência positiva sobre o transporte de íons, facilitando a absorção;
– aumento da respiração e da velocidade das reações enzimáticas do ciclo de Krebs, resultando em maior produção de ATP;
– aumento no conteúdo de clorofila;
– aumento na velocidade e síntese de ácidos nucleicos;
– efeito seletivo sobre a síntese proteica;
– aumento ou inibição da atividade de diversas enzimas.
Nutrição
O incremento na absorção de nutrientes proporcionado pela presença de ácidos húmicos na solução do solo tem sido justificado pelo aumento da permeabilidade da membrana plasmática (MP) por meio da ação surfactante das substâncias húmicas (SH) e da ativação da enzima H+-ATPase da membrana plasmática.
O gradiente eletroquímico gerado pela H+-ATPase da MP está diretamente envolvido com dois mecanismos fundamentais do desenvolvimento vegetal: a energização de sistemas secundários de translocação de íons fundamentais para a absorção de macro e micronutrientes e o aumento da plasticidade da parede celular para possibilitar o processo de crescimento e a divisão da célula vegetal.
Esse último mecanismo está relacionado com a teoria do crescimento ácido que postula que um aumento da extrusão de prótons mediado pela H+-ATPase promove a acidificação do apoplasto, que por sua vez ativa enzimas específicas que atuam sobre a parede celular, aumentando sua plasticidade e, consequentemente, permitindo o alongamento da célula.
Tais efeitos se refletem na aceleração das taxas de crescimento radicular, no incremento de biomassa vegetal e nas alterações na arquitetura do sistema radicular (ex.: incremento da emissão de pelos radiculares e de raízes laterais finas), resultando em aumento da área superficial, comprimento e volume do sistema radicular.